Gentes diferenciadas

Em recente eleição internacional um restaurante paulistano foi eleito o sétimo melhor do mundo. Pelas ruas já se ouve o ufanista grito de “É Brasil sil sil sil sil !!!”. Ruas?. É... menos, menos ... de início começamos com duas: a do restaurante, e a Oscar Freire, entre as oito ruas de comércio mais elegante do mundo. É na Oscar Freire, com lojas das maiores grifes de roupa do mundo, que a nossa Editora Chefe Fernanda, a Lenda, escolhe os modelitos usados nas cerimônias de premiaçoes literárias.

No bar do Seu João, nas proximidades do Grito do Ipiranga, a boa nova é anunciada pelo José Carlos Judeu, diretor financeiro de empresa de assessoria ao segmento bancário, que desenvolveu o bom gosto, o prazer e o conhecimento da boa mesa: “... é assim como estar entre as sete maravilhas do mundo, a entrada definitiva do Brasil no segmento gastronômico mundial”. Judeu ciceroneia executivos em visita à sua empresa apresentando-os à alta gastronomia paulistana. “É necessária uma semana para conseguir fazer reserva e agora, depois desse prêmio, no mínimo um mês” observa o Luiz, executivo do ramo gráfico, se juntando à roda. Colocando no balcão o copo de uísque o professor Renato pede licença para dar mais uma informação: “quando você liga a telefonista já pergunta qual a marca do carro do interessado que é para ir eliminando, dependendo do carro encerra a conversa”. O Niltão, aquele do calo no joelho, culpa do banquinho de madeira fixado no chão bem próximo ao balcão, levanta-se após dar a sua opinião em outra roda de discussão, a final do campeonato paulista: “e fiquem sabendo que não dá para escolher data, horário e mesa, é que nem marcar consulta no SUS, é no dia em que eles tem vaga”. Antes de entrar no banheiro dá meia volta: “Ah! deu o tempo da reserva não tem aquele negócio que o papo está bom, pedir saideira para o garçom, que a próxima reserva já está esperando”. O Mineiro, alto executivo do mercado financeiro, das bolsas e ações comenta que “é por isso que prefiro tomar as minhas cachacinhas lá nos botecos de Bocaiuva, no meu querido Vale do Jequitinhonha”. Do outro lado do balcão o Marquinhos, o assessor geral do bar, entre uma bronca do Seu João, a marcação dos gastos, abertura das garrafas e opiniões nas diversas rodas de discussão e como que para por um final na conversa: “ sabe quanto custa só para experimentar o tal de menu degustação? fica em quase um salário mínimo sem direito à bebida, e vocês ficam perdendo tempo nesse papo, que isso?”.

A capacidade dos frequentadores de boteco de participar de várias conversas ao mesmo tempo e de sobretudo ter opinião sobre tudo merece ser melhor discutido nas rodas balconisticas.

No Cantinho do Assaré, o Recanto do Patativa, ali na Aclimação, cerimonial de reserva é desnecessário, explica o Ribinha: “ aqui não é um restaurante, é uma casa, todos são amigos e num tem negócio de reserva, se achegue que a gente vai acomodando”. A espera é na garagem e no corredor entre porções de queijo coalho na chapa, pinguinha do Vale do Cariri, som de Luiz Gonzaga e declamações de poemas de Patativa pelo Ribinha, enquanto serve as mesas.

O bar do Jóinha, não tem telefone fixo e muito menos celular. O Jóinha, também conhecido por Leonel, atende sózinho os clientes, frita pastéis, prepara uma completa tábua de frios, serve cerveja gelada, dá sugestão de uma, ou várias, das mais de quinhentas marcas de cachaça expostas nas paredes do bar. Imagina ainda dar tempo de aceitar reservas. Mesmo quando faz algum cadastro e é pedido o número do telefone ele diz que “estou aqui há quarenta e cinco anos, quem quiser sabe onde me encontrar, o bar é aberto à partir das cinco da tarde e as portas estão abertas a todos”.

O Bar do Frango aceita reservas de pessoas à procura de uma boa conversa, de uma boa musica em seu pequeno espaço. Os banquinhos estão sempre reservados para os amigos que chegam.

No Bar do Zé Ladrão, ali nas Perdizes, o cliente não precisa ser reservado, (tímido, sem jeito), vai até a geladeira, escolhe a cerveja, abre, o abridor está pendurado ali ao lado, coloca a tampinha em uma caixa e leva a garrafa para o Zé, o proprietário, abrir. Deixa as vazias em cima da mesa e se faltar espaço coloca no engradado. No final o Zé, há quarenta anos no bairro, conta as garrafas. Simples né?.

Gente diferenciada do lado de lá e do lado de cá. Que são diferentes e que são iguais, do lado de lá e do lado de cá.


O lado de lá no Itaim Paulista
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